Atualização da lei de recuperação e falência apoia retomada da economia
Em 24 de dezembro de 2020, entrou em vigor a Lei 14.112/2020, atualizando a antiga lei 11.101/2005, que se refere aos Institutos da Recuperação Judicial e Falência. A ideia das alterações foi conferir maior agilidade aos procedimentos e garantir condições mais favoráveis à reestruturação de empresas em crise.
Agosto | 2021Resultado de um longo diálogo entre diversos operadores do direito especializados na matéria, a reforma, que tem sido pensada e discutida desde muito antes do atual contexto de crise econômico-financeira ocasionada pela pandemia da Covid-19, mostra-se bastante pertinente para o momento vivido pelo País.
O texto estabelece diversas mudanças relevantes, entre as quais se destacam a alteração do papel do Fisco e da possibilidade de que seja requerida a falência da empresa em recuperação judicial nos casos em que não estejam sendo adimplidas as obrigações da empresa devedora no contexto fiscal, o tratamento da arrecadação e a alienação de ativos relacionados à falência. Também se apresentam questões bastante importantes no âmbito do procedimento de recuperação judicial inspiradas no direito americano, como a possibilidade de apresentação de plano alternativo pelos credores. Outras alterações que podem ser destacadas são:
- Possibilidade de prorrogação do stay period por mais 180 dias, desde que o devedor não tenha contribuído para o descumprimento do prazo inicial (art. 6º, § 4º). Se, ao final desse período, os credores apresentarem plano alternativo de recuperação, o stay period será restabelecido (art. 6º, § 4º-A);
- Ampliação do prazo de parcelamento dos débitos com a União, passando de sete para dez anos (art. 10-A, V, Lei 10.522/2002);
- Ampliação do rol de funções do administrador judicial – AJ (art. 22);
- Estímulo à composição, antes ou no curso do processo judicial (arts. 20-A e ss. e art. 22, II, “e” e “g”);
- Previsão do instituto da constatação prévia (art. 51-A), que já estava previsto na jurisprudência;
- Possibilidade de prorrogação do prazo para pagamento dos créditos trabalhistas (art. 54, § 2º);
- Definição de critérios objetivos para a distribuição de pedidos de recuperação judicial de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico (art. 69-G e ss.);
- Possibilidade de acesso do devedor a novos financiamentos, mediante autorização judicial (art. 69-A a 69-F);
- Reconhecimento da legitimidade do produtor rural para requerer a recuperação judicial (art. 70-A);
- Reconhecimento da legitimidade do Fisco para requerer a falência de empresas em recuperação (art. 73, V e VI);
- Previsão de prazos específicos e procedimento mais ágil para a falência, o que diminui o tempo necessário para que o devedor possa iniciar nova atividade empresarial – “fresh start” (art. 75, III e art. 158, V);
- Alteração da ordem de classificação dos créditos concursais (art. 83) e do rol de créditos extraconcursais (art. 84);
- Maior destaque à recuperação extrajudicial e modificações em seu procedimento, entre eles a inclusão de créditos trabalhistas (art. 161);
- Regulamentação de processo transnacional de recuperação de empresas (art. 167-A e ss.).
São todas medidas que certamente causarão impacto expressivo nos processos que venham a ser ajuizados sob a vigência da Lei 14.112/2020. Ainda não se sabe de forma concreta como se comportarão os players do mercado, tampouco se a pretensão do legislador ao instituir certas medidas será refletida na prática.
Muito se discute a respeito do papel que terá o Fisco nesses processos a partir de agora. Um credor que antes era extraconcursal, com pouca ou quase nenhuma relação com o processo recuperacional, é, hoje, um player crucial no sucesso do procedimento.
Embora ainda não tenha sido possível observar na prática o impacto de todas essas alterações, é certo que o sucesso de sua implementação terá papel relevante na recuperação da situação econômico-financeira do País, agravada de forma expressiva pela pandemia de Covid-19. Se adequadamente aplicada, a Lei 14.112/2020 será importantíssima para o fomento da economia e manutenção da atividade empresarial e dos empregos.
Diante da relevância das atualizações implementadas, a Deloitte desenvolveu um book que apresenta indicações detalhadas das mudanças e inclusões da lei em um quadro comparativo, com destaque para os temas mais discutidos ao longo dos processos de recuperação judicial e falência. Com o objetivo de ser uma ferramenta de apoio aos estudos e debates que surgirão a partir desse novo marco legal para a reestruturação de empresas no Brasil, o material também traz um índice alfabético-remissivo e está disponível no site da Deloitte.
Ana Beatriz Martucci Nogueira Moroni é sócia da área de Financial Advisory e líder da prática de Reestruturação Empresarial da Deloitte