Ator da convergência
As telecomunicações têm o papel de integrar digitalmente todos os setores da economia, fomentando uma verdadeira revolução nos negócios pautada pela conectividade e pela inovação; Internet das Coisas é a estrela desse movimento.
Outubro-Dezembro | 2017O mercado de telecomunicações vive um momento único, instigado pela velocidade com a qual a transformação digital está invadindo o dia a dia de pessoas e empresas e modificando hábitos e modelos de negócios em todo o mundo. Nesse cenário, a palavra de ordem é conectividade, em um setor que mudou sua vocação de voz para dados, atingindo um patamar inédito de interatividade.
Essa evolução é ainda maior porque a comunicação está mudando da interação entre pessoas para a comunicação também com “coisas”, impulsionando inovações em variados setores da economia. É o que observa Craig Wigginton, líder global de Telecomunicações da Deloitte, que esteve no Brasil, em outubro, para integrar a comitiva de especialistas da organização no Futurecom – maior evento de telecomunicações e tecnologia da América Latina, realizado em São Paulo – e na terceira edição do IoT Lunch, encontro realizado na mesma semana, pela própria Deloitte.
Estamos apenas no começo de uma transformação sendo aquecida pela Internet das Coisas. Em cinco a dez anos, saltaremos das atuais duas coisas conectadas por pessoa para 40 ou 60. E os smartphones serão o principal hub dessas conexões., Craig Wigginton, líder global de Telecomunicações da Deloitte.
O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) estima que o benefício esperado com a Internet das Coisas (IoT) poderá chegar a US$ 200 bilhões por ano em 2025, o que representa 10% do Produto Interno Bruto (PIB) atual do Brasil. O Ministério avalia que a IoT será um marco na economia nacional, comparável ao processo de privatizações ocorrido na década de 1990.
As ações do governo previstas no Plano Nacional de IoT visam ampliar a competitividade da economia brasileira no cenário global e contribuir substancialmente com áreas como saúde, indústria, agronegócio e cidades.
Para Marcia Ogawa, sócia-líder de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da Deloitte no Brasil, o País está na fase de mobilidade e execução. Agora, é preciso partir para a prática.
O presidente da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp), João Moura, destacou que toda a movimentação para o fortalecimento e a disseminação da IoT no Brasil é pertinente e acredita ser este um caminho sem volta na evolução do cenário tecnológico brasileiro.
“A tecnologia é protagonista da transformação digital e tem contribuído para a criação de um novo desenho da cadeia de valor em diversas indústrias. O mercado está a cada dia mais diversificado, com novos players. Os competidores tradicionais que não se transformarem não sobreviverão para contar essa história”, alertou o executivo.
A indústria de telecomunicações ocupa um papel relevante na missão de integrar os demais setores e melhorar a sua produtividade. Para isso, devemos perseguir a inclusão das nossas empresas nas cadeias globais e também dos nossos jovens nesse movimento., Marcia Ogawa, sócia-líder de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da Deloitte no Brasil.
Por um país mais competitivo
A empresa pública Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) é forte aliada na evolução da IoT em solo nacional. “Estamos criando condições de financiamento para suportar essa avaliação e a evolução da tecnologia”, diz André de Castro Pereira Nunes, superintendente da área de Inovação em Defesa, Energia e Tecnologia da Informação da Finep.
Em maio deste ano, a Finep promoveu a primeira rodada da chamada pública para o Programa de Investimento em startups inovadoras. “O mercado respondeu muito bem. Estamos selecionando projetos das 503 propostas recebidas. Entre elas, 135 foram de IoT, ou seja, quase 30% da demanda. Isso significa que, realmente, há uma efervescência nesse setor”, afirma Nunes.
Nunes avalia que as empresas ainda estão em um estágio nascente da tecnologia, o que se refletiu na qualidade das propostas. “Isso é natural, por se tratar de empresas muito novas, que ainda não possuem capacidade de apresentar propostas mais robustas e mais focadas no mercado e no benefício para a sociedade do que apenas na tecnologia”, alerta o superintendente.
Em maio de 2017, a Finep também acenou para o mercado com o Programa de Telecomunicações, que visa financiar empresas para aquisição de equipamentos de telecomunicações desenvolvidos no Brasil. Podem participar empresas nacionais ou estrangeiras, desde que o desenvolvimento seja feito no Brasil.
O desafio da conectividade
O agronegócio, setor de significativa representatividade na economia brasileira, aguarda esses avanços em IoT, uma das grandes promessas para torná-lo ainda mais competitivo. Contudo, essa trilha pode sofrer entraves diante da questão da conectividade no Brasil, considerando que as regiões de atuação desse setor são desassistidas de infraestrutura em sua maior parte.
Para José Gontijo, do MCTIC, as empresas ainda estão presas a modelos de negócios tradicionais, mas terão de mudar suas estratégias e buscar parceiros em um padrão em que todos ganhem. “Entendo que o investimento em regiões pouco densas não é atraente quando o retorno, inicialmente, não se apresenta favorável. No entanto, várias negociações podem ser feitas, como buscar a iniciativa privada para investir no desenvolvimento local, tornar a região mais atraente comercialmente e, assim, identificar lucros e justificar o empenho”, destaca.
Pequenos provedores, grandes agentes
De acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), atualmente, mais de 60% do crescimento da banda larga do Brasil é atribuído à atuação de pequenos provedores regionais. Isso significa que eles têm puxado o investimento da internet justamente em pequenas cidades do interior.
Aníbal Diniz, do Conselho Diretor da Anatel, concorda que os pequenos provedores nacionais serão fundamentais para a formação do ecossistema de IoT no Brasil, à medida que se inserem em um sistema de compartilhamento de infraestruturas. “Ninguém terá como proporcionar essa megaestrutura sozinho”, disse durante participação em painel no Futurecom 2017.
“Entre 2016 e 2017, mais de 50% das adições de banda larga no Brasil foram feitas por meio de provedores. Somos, certamente, atores naturais desse cenário e estamos cuidando da conectividade”, afirma Erich Rodrigues, vice-presidente do Conselho da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint).
investimento em infraestrutura é vital
De acordo com Duncan Stewart, diretor de Pesquisas em Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da Deloitte no Canadá, economias em desenvolvimento que ainda não investiram em infraestrutura de telecomunicações agora estão em posição de liderar esses investimentos, usando tecnologias wireless de baixo custo, movendo-se mais rapidamente do que os países desenvolvidos. Por essa razão, o Brasil deve se apressar em atualizar suas redes para preparar o ambiente para o avanço das telecomunicações e da IoT.
Stewart alerta para a próxima geração da telefonia celular, o 5G, que precisa dessa atualização para acontecer. Segundo o diretor da Deloitte, será necessária a construção de redes de fibra óptica, com ampliação da infraestrutura. Essa evolução com o 5G, estimada para 2020, irá revolucionar o mercado com o provimento de internet ultrarrápida, de baixa latência e com alta confiabilidade de rede, e irá expandir os negócios com IoT.
A iniciativa, no entanto, demandará muitos investimentos para a implementação da fibra em áreas metropolitanas. “Nos Estados Unidos, serão investidos entre US$ 130 bilhões e US$ 150 bilhões na construção do 5G nos próximos cinco a sete anos”, estima Stewart.
Muito investimento em 5G será demandado, mas os benefícios são impressionantes. A fibra é uma necessidade para ter conectividade wireless de qualidade., Duncan Stewart, diretor de Pesquisas em Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da Deloitte no Canadá.
Manufatura 4.0
Muitas empresas têm sido aliadas na jornada de fortalecimento da IoT no Brasil. Essa união de esforços vai proporcionar mais inteligência na prestação de serviços públicos e privados, capacitação de pessoas, inovação e empreendedorismo, além de colocar o País como desenvolvedor de tecnologias no mercado global.
A Pollux, empresa de tecnologia industrial, é uma delas. Seu presidente, José Rizzo, tem exercido a função de incentivador da evolução da IoT na indústria nacional, reunindo grupos de diversas esferas da iniciativa privada e universidades. Rizzo fortaleceu sua atuação nessa jornada por ser também co-fundador e presidente da Associação Brasileira de Internet Industrial (ABII).
“O Brasil tem tudo para ser bem-sucedido nesse mercado”, afirma Rizzo. O executivo relata que a Pollux tem trazido modelos inéditos de internet industrial para o País, de forma que todo o segmento industrial brasileiro ganhe força perante os avanços importantes observados na Europa, na América do Norte e na Ásia.
“O modelo de negócio ‘robô como serviço’ é uma tendência na indústria lá fora e agora conseguimos oferecê-lo aqui, em indústrias nas quais não tínhamos acesso. Quando falamos de robôs no Brasil, cerca de 85% estão na indústria automotiva. É preciso abrir essa discussão para outros setores”, acredita.
Inovação em mobilidade urbana
Os sistemas de meios de pagamento também têm muito a se beneficiar da evolução do setor de telecomunicações no Brasil. Em um exemplo, a Alelo, bandeira especializada em soluções de benefícios e gestão de despesas corporativas, prepara-se para ingressar no segmento de pedagiamento eletrônico em rodovias e de estacionamentos de shoppings.
A nova atuação acontece por meio da marca Veloe, criada para oferecer um serviço totalmente digital com foco na experiência do cliente e na simplicidade de uso. “Nossos serviços estarão apoiados em tecnologias de ponta, como Internet das Coisas, o que possibilitará a expansão da comunicação por meio de variados dispositivos, desde smartphones a tecnologias vestíveis”, destaca Raul Moreira, presidente da Alelo.
Essa estratégia transformadora está apoiada no uso de tecnologias como business intelligence e analytics, contribuindo para a promoção de uma cultura digital da empresa.
Também nessa trilha, a TIM prepara uma unidade de negócios focada em IoT e analytics; um coworking para receber startups e parceiros de negócios para desenvolver soluções nessa área. O espaço vai contar com equipe multidisciplinar, apoiada em conceitos e métodos de startup, e nasce com uma receita de mais de R$ 50 milhões ao ano a partir das conexões de M2M (“machine to machine”) existentes. O objetivo, segundo a operadora, é agregar serviços de valor à conectividade, principalmente em áreas como agropecuária, cidades, saúde e transportes.
“Além de a empresa ir em busca de parceiros estratégicos, também queremos estimular e desenvolver novos modelos de negócios, oferecendo inteligência agregada à conectividade”, destaca Luís Minoru Shibata, vice-presidente de Estratégia e Inovação da TIM Brasil.
José Gontijo, do MCTIC, desenha um futuro hiperconectado, no qual toda a sociedade poderá desfrutar dos benefícios da IoT (que, segundo ele, perderá esse nome e se tornará simplesmente “internet”), com as pessoas tendo mais tempo para si e para a família. “Os serviços serão mais automatizados, ágeis e integrados, resultando em mais facilidade, produtividade, lucro e profissões inovadoras e em um Brasil mais próspero.”
Brasileiros estão conectados na madrugada
A pesquisa “Global Mobile Consumer Survey 2017”, realizada em 21 países, incluindo uma amostra de 2.000 usuários de celular no Brasil, trouxe resultados curiosos sobre o perfil do brasileiro conectado. Um deles é que 45% dos jovens do Brasil entre 18 e 24 anos costumam checar suas redes sociais durante a madrugada.
O comportamento veio atestar que os brasileiros estão cada vez mais conectados a seus smartphones. De acordo com Marcia Ogawa, sócia-líder de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações da Deloitte no Brasil, por essa razão, mesmo com a crise econômica no País, a pesquisa identificou um aumento de 7% no número de proprietários de smartphones em relação a 2016.
“Foi uma das surpresas registrarmos que 87% dos respondentes possuem smartphones. Isso também se refletiu na queda do uso de tablets, reafirmando a preferência por smartphones, considerados os dispositivos de maior aceitação no Brasil”, destaca Marcia.
Apesar do aumento de mais de 38% na penetração do 4G no Brasil identificado entre os participantes do estudo no País, o wi-fi se consolidou como a conexão mais usada para o acesso à internet pelos brasileiros entrevistados. “Essa realidade de hiperconectividade coloca à indústria de telecomunicações a necessidade de adequar canais, infraestrutura e oferta de serviços para atender a essa demanda crescente”, pontua a sócia da Deloitte.